Nos últimos tempos, todos os dias faço limpezas nas minhas redes sociais. Minha capacidade de tolerância, que é bem elástica, nunca foi tão demandada. Pretendo permanecer serena e com capacidade de análise, logo, as providências para reduzir os estímulos recebidos são vitais.
Sinto-me navegando em um oceano de dissonâncias. Dissonância cognitiva, especialmente, evidenciada pelas distorções entre discurso, pensamento e ação de líderes, nos quais a honestidade da pregação convive com as mentiras, os roubos e as extorsões da prática. Práticas essas naturalizadas pela frequência. Algo que um dia significou ameaça à honra, hoje, pela frequência, é visto como "normal" pelos cidadãos anestesiados.
Sempre houve manipulação. As mentiras atravessam os milênios da existência da nossa espécie e seguem poderosas como forma sutil de controle. O fator que altera a abrangência do seu poder é a rapidez com a qual os mecanismos de manipulação são transmitidos de uma pessoa para outra. Este fluxo está cada vez mais acelerado.
Examinando a história, encontramos absurdos perpetrados com base nos mecanismos de manipulação. Dos inúmeros exemplos, cito uns poucos: a caça às bruxas, a Inquisição, a perseguição aos judeus, a escravização e, bem recentemente, a perseguição implacável aos cientistas e aos jornalistas.
Desde muito cedo, ainda criança, eu ficava impressionada com as pessoas grandes se comparando ou comparando umas com as outras. Em uma família muito grande, nós, crianças, éramos, com frequência, submetidas aos tribunais dos adultos, que nos definiam com seus barulhentos julgamentos. Nem eles próprios imaginavam as pequenas feridas que iam se abrindo naquelas jovens psiques.
De modo semelhante, nas histórias infantis, aqui e acolá, tragédias representavam o desfecho de uma sequência interminável de comparações. Acredito que todos conseguem se lembrar da madrasta da Branca de Neve, que, já dona e proprietária do pai da menina e de seus bens, se desespera ao se comparar com a alva beleza da enteada. Com a duvidosa parceria do seu espelho "mágico", já que este era constrangido, ameaçado, forçado a manter a Rainha no pódio inconteste da beleza, para a Branca, ganhadora em uma comparação, a sentença de morte.
Já faz muito tempo, talvez décadas, que as comemorações dos “dias” me incomodam. Desde as celebrações de Natal até os dias dedicados a pais, mães e crianças.
Passei minha infância em uma cidade do norte de Minas Gerais, hoje uma cidade grande, antes uma pequena cidade do sertão.
No dedo da mulher brilha uma bela e vistosa aliança. A joia tem espirais que terminam em pequenos diamantes. Cinco delas acrescentam características únicas à peça. Acontece que o que parece aliança não é. Foi. O anel, hoje, representa o fim de um casamento de longa duração.
Duas alianças derretidas em uma só. É ao mesmo tempo lápide e certidão de nascimento. Representa um novo casamento, desta vez consigo mesma. Simboliza uma decisão de lealdade a si e aos seus propósitos. Sepulta definitivamente a entrega da essência em troca de migalhas.
Pensando na minha jornada profissional, vejo-me, boa parte do tempo, partilhando decisões com meus clientes que os levam a experimentar novos modus operandi.
Modus operandi (latim) traduzida literalmente para o português indica “modo de operação". A expressão determina a maneira que determinada pessoa utiliza para trabalhar ou agir, ou seja, suas rotinas e seus processos de realização.
Navegando nos mares das mentiras, das falsas notícias, dos enganos, invariavelmente me assusto. Ao analisar as ondas pútridas dos engodos, ainda me espanto de saber que pessoas escolhem mentir e outras tantas também escolhem aceitar a manipulação.
Honestidade está na ponta oposta deste comportamento. Uma pessoa honesta será honrada, respeitada, digna. As outras pessoas saberão que, ao conviver com honestidade, não serão submetidas às mentiras, às fraudes, aos enganos.
“Quando a luz dos olhos meus / E a luz dos olhos teus / Resolvem se encontrar / Ai que bom que isso é meu Deus”, fragmento de texto de Vinicius, musicado por Tom Jobim – uma bela canção, que de certa forma ilustra minhas reflexões mais recentes.
A conexão entre dois olhares é potente de tal maneira que a “luz” é muito razoável como descrição. Um rosto humano solicita a compreensão da singularidade, da coragem e da solidão de cada um de nós neste planeta. Ao nos conectar, inevitavelmente, seremos levados, pela nossa estrutura enquanto espécie, a traduzir as expressões do ser à nossa frente.
Cada abandono gera trauma e dívida. O abandonado lidará com esta dor, que, não tratada, poderá acompanhá-lo pela jornada inteira da vida. Aquele que abandona adquire uma dívida, que mesmo negada, lá estará, acumulando-se em pilhas e pilhas de afeto negado, cuidado negado, segurança negada, estímulo negado, validação negada. Diferentes dimensões da inadimplência emocional.
Quero dialogar a respeito do abandono parental, mas qualquer abandono tem potencial gerador de dor e dívida. Ou seja, em qualquer época será muito duro lidar com abandono, mas nada será comparado com o dano causado a uma criança quando é abandonada pelos seus genitores ou cuidadores.
Aspectos de mim que não conheço alicerçam minha jornada pela vida. É quase assustador pensar que, dos recônditos da minha mente, o que não conheço estimula minhas reações ao viver.
Alguns desses fatores se perderam na memória ou se escondem com eficiência. Outros, enterrei deliberadamente. Muitos arranham a superfície da consciência e quase se apresentam. Outros estão submersos profundamente e sei que, mesmo das sombras, sabotam e desestabilizam meus meios e modos de gerenciar a vida.