Em 1977, o então presidente da Fundação Cultural de Curitiba, Ennio Marques Ferreira, convida o artista gravurista Orlando DaSilva para ministrar o curso intensivo de gravura no Centro de Criatividade. Inicia-se a prolongada estadia de um dos maiores escritores acerca da gravura curitibana, colaborador próximo mesmo quando ainda residia no Rio de Janeiro. Em meio à comemoração do centenário do icônico artista curitibano Poty Lazzarotto, relembro um de seus mais expressivos pesquisadores. A dedicação de DaSilva ao ensino, documentação e difusão da gravura ilustra a historiografia do campo na segunda metade do século XX, a reverberar em minhas reflexões acerca de seu estatuto contemporâneo.
Introduzo com uma breve vereda biográfica: colega de Poty desde as oficinas ministradas por Carlos Oswald no Liceu de Artes e Ofícios no Rio de Janeiro, DaSilva dedicou-se à compilação e publicação das produções de Guido Viaro, do paulista e também colega Marcelo Grassmann, de seu mestre Carlos Oswald. Em sua primeira publicação voltada a um único artista, Carlos Oswald – o Gravador (1969), DaSilva endossou a pertinente lacuna na difusão da gravura brasileira, ao pontuar que “o levantamento catalográfico das obras dos artistas [gravuristas] era quase nulo, assim como o histórico-crítico”.
Gravurista, professor e bibliógrafo, Orlando DaSilva atuava com preocupações abertamente mercadológicas quanto ao reconhecimento e valorização do campo perante os colecionadores de arte – tomada como “arte menor”, escrevia a defesa de uma arte maior. Ainda que profundamente valorizasse a individualidade do gravurista, elaborou o livro técnico A arte maior da gravura (1976) não apenas para guiar o léxico do colecionador de arte e possíveis interessados, como também se posicionava na contramão de vertentes modernistas da coeva gravura carioca e paulista, em específico as quais o conhecimento técnico tradicional a princípio não era objeto máximo de estudo e especulação (a respeito dessa preocupação técnica, vale pontuar que, no respectivo livro citado, DaSilva nem ao menos considera a litografia como gravura: a imagem gráfica desta não parte de um substrato cavado, então seria apenas estampa).
O próprio autor [DaSilva] distingue, no diálogo com o “amante da arte”, o “lado artístico” e o “saber correto”. Ou seja: o artista deve sentir-se inteiramente livre dos condicionamentos do consumo; em paz com os meandros de seu mundo interior e com o mistério, inesgotável, de seu processo de criação. Mas enquanto artesão, deve o gravador, como artista, deixar patente seu domínio sobre a maneira correta de fazer. Numa palavra: precisa conhecer a técnica de gravar (Paulo de Tarso Santos, no prefácio de A arte maior da gravura).
Tal posicionamento era compartilhado e manifestou-se na I Mostra de Gravura (1978), em Curitiba, quando DaSilva já residia na cidade. Gravurista convidado, o paulista Odetto Guersoni anunciou na ocasião uma defesa enfática do ensino e conceituação da gravura brasileira, assim como da validação de autenticidade de tiragens – pretensão mercadológica diante do crescente emprego artístico de fotocópias e xerox, conforme relata o pesquisador Artur Freitas no artigo Gravura expandida: as Mostras da Gravura dos anos 1990 (2010).
Ao final do artigo, Freitas aponta para a assimilação de uma gravura expandida (expansão como termo emprestado da crítica estadunidense Rosalind Krauss) nas últimas edições da Mostra, a preceder a perspectiva de uma crise conceitual do campo, na indefinição da atuação e curadoria de exposições específicas à gravura diante da dissolução entre as tradicionais fronteiras entre as linguagens artísticas. Assim, após a XII edição em 1999, o encerramento das Mostras foi categórico, arrebatado pela falta de apoio governamental pretensamente alimentada pelos motivos anteriormente expostos. Para um desavisado espectador, talvez a gravura, enquanto um título com todo seu aparato de tutela midiática, tenha sumido desde então. Adiciono o mérito do fim das críticas e colunas associadas à arte em jornais, do qual reflito conforme o exercício da coluna do Gracon na Cidade Capital inevitavelmente me leva a associar uma coisa à outra. A escrita é coisa distinta do fato; aqui, das produções em gravura, devidamente especificadas como parte de um esforço de um grupo de pesquisa dedicado ao campo. Contudo, escrever olha, registra e difunde pertinências, sendo estas fomentos ou lacunas de um entorno que as palavras circunscrevem. Preenche o silêncio e aproxima-se interessado e desavisado. Em muito o que se toma como gravura contemporânea se afasta da visão artística de DaSilva, Guersoni, e uma série de outros gravadores coevos à segunda metade do século XX. O esforço feito nessa presente coluna não representa um movimento evolutivo frente à escrita em gravura – termo terrível! –, mas, talvez, a afirmação de uma mesma necessidade que pairava o ar que DaSilva sorveu ao escrever sobre o que se produziu historicamente no Brasil e o que passou a se produzir, pessoalmente e ao seu redor. Penso que o esforço da escrita, em um dispositivo midiático no século XXI, parte como contraponto da sina da produção artística brasileira, de uma permanente condição de começar de novo, como pontuado por Paulo Venâncio Filho no texto Lugar nenhum: o meio de arte no Brasil (1980). Assim como via DaSilva, a noção de uma crise, da desvalorização sistêmica, do silêncio ensurdecedor na não-transmissão de conhecimento. A disparidade entre A arte maior da gravura e a coluna do Gracon se situa especificamente no alvo. Enquanto DaSilva almejava o léxico técnico para valorização mercadológica, aproximo a presente escrita do esforço em quebrar a arte como espaço fechado em si mesmo, defesa compartilhada por Venâncio Filho.
Ora, se as fronteiras se expandem e se dissolvem, há mais do que se estudar, produzir e difundir. O que se distingue é o modus operandi: não há mais espaço para um manual, um código de conduta à gravura. Discute-se e se difunde em diálogos abertos ao contágio da comunidade. O artista que, em sua interdisciplinaridade, escreve sobre as dúvidas no próprio processo; o pesquisador que compila produções em novos dimensionamentos perante inserções históricas e sociais; o estudante que compartilha interesses no ineditismo do próprio contato com algum aspecto do campo. Claro, muitas variações técnicas são pesquisadas, sucedendo as já registradas em A arte maior da gravura; e deve-se haver espaço para a comunicação destas também, assumindo que a estrita não se baseia mais em um veio estritamente técnico e inflexível. Se em Orlando DaSilva se prezava a paixão do momento de feitura da matriz – sempre cavada! –, a contemporaneidade fita a revelação, a separação entre matriz e suporte. É, assim, momento de suspensão, onde a imagem gráfica é um mistério lançado aos inúmeros fatores que atravessam as intenções na feitura. O papel da escrita continua sendo de registro, porém também se reafirma, assim como em DaSilva, como defesa de formas de pensar perante o ofício e o mundo. O contexto – mundo e artista – mudou. Em que a retomada do título gravura circunscreve tais mudanças?
Por Heloisa Panuci
O festival de música Rock in Rio inicia nesta sexta-feira (13) e segue até domingo (22) na Cidade do Rock, localizada na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro.
O evento completa 40 anos da sua primeira edição e promete uma celebração histórica. A organização espera receber mais de 700 mil pessoas, entre moradores do estado, turistas brasileiros e estrangeiros.
Pesquisa do Instituto Alana indica que nove em cada dez brasileiros acreditam que as redes sociais não protegem crianças e adolescentes. O levantamento, realizado pelo Datafolha, ouviu 2.009 pessoas, com 16 anos ou mais, de todas as classes sociais, entre os dias 12 e 18 de julho.
Segundo o estudo, divulgado nesta quinta-feira (12), 97% dos entrevistados defendem que as empresas deveriam adotar medidas para proteger crianças e adolescentes na internet, através da comprovação de identidade, melhoria no atendimento ao consumidor para denúncias, proibição de publicidade e venda para crianças, fim da reprodução automática e da rolagem infinita de vídeos e limitação de tempo de uso dos serviços.
Em 1977, o então presidente da Fundação Cultural de Curitiba, Ennio Marques Ferreira, convida o artista gravurista Orlando DaSilva para ministrar o curso intensivo de gravura no Centro de Criatividade. Inicia-se a prolongada estadia de um dos maiores escritores acerca da gravura curitibana, colaborador próximo mesmo quando ainda residia no Rio de Janeiro. Em meio à comemoração do centenário do icônico artista curitibano Poty Lazzarotto, relembro um de seus mais expressivos pesquisadores. A dedicação de DaSilva ao ensino, documentação e difusão da gravura ilustra a historiografia do campo na segunda metade do século XX, a reverberar em minhas reflexões acerca de seu estatuto contemporâneo.
Introduzo com uma breve vereda biográfica: colega de Poty desde as oficinas ministradas por Carlos Oswald no Liceu de Artes e Ofícios no Rio de Janeiro, DaSilva dedicou-se à compilação e publicação das produções de Guido Viaro, do paulista e também colega Marcelo Grassmann, de seu mestre Carlos Oswald. Em sua primeira publicação voltada a um único artista, Carlos Oswald – o Gravador (1969), DaSilva endossou a pertinente lacuna na difusão da gravura brasileira, ao pontuar que “o levantamento catalográfico das obras dos artistas [gravuristas] era quase nulo, assim como o histórico-crítico”.
Gravurista, professor e bibliógrafo, Orlando DaSilva atuava com preocupações abertamente mercadológicas quanto ao reconhecimento e valorização do campo perante os colecionadores de arte – tomada como “arte menor”, escrevia a defesa de uma arte maior. Ainda que profundamente valorizasse a individualidade do gravurista, elaborou o livro técnico A arte maior da gravura (1976) não apenas para guiar o léxico do colecionador de arte e possíveis interessados, como também se posicionava na contramão de vertentes modernistas da coeva gravura carioca e paulista, em específico as quais o conhecimento técnico tradicional a princípio não era objeto máximo de estudo e especulação (a respeito dessa preocupação técnica, vale pontuar que, no respectivo livro citado, DaSilva nem ao menos considera a litografia como gravura: a imagem gráfica desta não parte de um substrato cavado, então seria apenas estampa).
O próprio autor [DaSilva] distingue, no diálogo com o “amante da arte”, o “lado artístico” e o “saber correto”. Ou seja: o artista deve sentir-se inteiramente livre dos condicionamentos do consumo; em paz com os meandros de seu mundo interior e com o mistério, inesgotável, de seu processo de criação. Mas enquanto artesão, deve o gravador, como artista, deixar patente seu domínio sobre a maneira correta de fazer. Numa palavra: precisa conhecer a técnica de gravar (Paulo de Tarso Santos, no prefácio de A arte maior da gravura).
Tal posicionamento era compartilhado e manifestou-se na I Mostra de Gravura (1978), em Curitiba, quando DaSilva já residia na cidade. Gravurista convidado, o paulista Odetto Guersoni anunciou na ocasião uma defesa enfática do ensino e conceituação da gravura brasileira, assim como da validação de autenticidade de tiragens – pretensão mercadológica diante do crescente emprego artístico de fotocópias e xerox, conforme relata o pesquisador Artur Freitas no artigo Gravura expandida: as Mostras da Gravura dos anos 1990 (2010).
Ao final do artigo, Freitas aponta para a assimilação de uma gravura expandida (expansão como termo emprestado da crítica estadunidense Rosalind Krauss) nas últimas edições da Mostra, a preceder a perspectiva de uma crise conceitual do campo, na indefinição da atuação e curadoria de exposições específicas à gravura diante da dissolução entre as tradicionais fronteiras entre as linguagens artísticas. Assim, após a XII edição em 1999, o encerramento das Mostras foi categórico, arrebatado pela falta de apoio governamental pretensamente alimentada pelos motivos anteriormente expostos. Para um desavisado espectador, talvez a gravura, enquanto um título com todo seu aparato de tutela midiática, tenha sumido desde então. Adiciono o mérito do fim das críticas e colunas associadas à arte em jornais, do qual reflito conforme o exercício da coluna do Gracon na Cidade Capital inevitavelmente me leva a associar uma coisa à outra. A escrita é coisa distinta do fato; aqui, das produções em gravura, devidamente especificadas como parte de um esforço de um grupo de pesquisa dedicado ao campo. Contudo, escrever olha, registra e difunde pertinências, sendo estas fomentos ou lacunas de um entorno que as palavras circunscrevem. Preenche o silêncio e aproxima-se interessado e desavisado. Em muito o que se toma como gravura contemporânea se afasta da visão artística de DaSilva, Guersoni, e uma série de outros gravadores coevos à segunda metade do século XX. O esforço feito nessa presente coluna não representa um movimento evolutivo frente à escrita em gravura – termo terrível! –, mas, talvez, a afirmação de uma mesma necessidade que pairava o ar que DaSilva sorveu ao escrever sobre o que se produziu historicamente no Brasil e o que passou a se produzir, pessoalmente e ao seu redor. Penso que o esforço da escrita, em um dispositivo midiático no século XXI, parte como contraponto da sina da produção artística brasileira, de uma permanente condição de começar de novo, como pontuado por Paulo Venâncio Filho no texto Lugar nenhum: o meio de arte no Brasil (1980). Assim como via DaSilva, a noção de uma crise, da desvalorização sistêmica, do silêncio ensurdecedor na não-transmissão de conhecimento. A disparidade entre A arte maior da gravura e a coluna do Gracon se situa especificamente no alvo. Enquanto DaSilva almejava o léxico técnico para valorização mercadológica, aproximo a presente escrita do esforço em quebrar a arte como espaço fechado em si mesmo, defesa compartilhada por Venâncio Filho.
Ora, se as fronteiras se expandem e se dissolvem, há mais do que se estudar, produzir e difundir. O que se distingue é o modus operandi: não há mais espaço para um manual, um código de conduta à gravura. Discute-se e se difunde em diálogos abertos ao contágio da comunidade. O artista que, em sua interdisciplinaridade, escreve sobre as dúvidas no próprio processo; o pesquisador que compila produções em novos dimensionamentos perante inserções históricas e sociais; o estudante que compartilha interesses no ineditismo do próprio contato com algum aspecto do campo. Claro, muitas variações técnicas são pesquisadas, sucedendo as já registradas em A arte maior da gravura; e deve-se haver espaço para a comunicação destas também, assumindo que a estrita não se baseia mais em um veio estritamente técnico e inflexível. Se em Orlando DaSilva se prezava a paixão do momento de feitura da matriz – sempre cavada! –, a contemporaneidade fita a revelação, a separação entre matriz e suporte. É, assim, momento de suspensão, onde a imagem gráfica é um mistério lançado aos inúmeros fatores que atravessam as intenções na feitura. O papel da escrita continua sendo de registro, porém também se reafirma, assim como em DaSilva, como defesa de formas de pensar perante o ofício e o mundo. O contexto – mundo e artista – mudou. Em que a retomada do título gravura circunscreve tais mudanças?
Por Heloisa Panuci
O festival de música Rock in Rio inicia nesta sexta-feira (13) e segue até domingo (22) na Cidade do Rock, localizada na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro.
O evento completa 40 anos da sua primeira edição e promete uma celebração histórica. A organização espera receber mais de 700 mil pessoas, entre moradores do estado, turistas brasileiros e estrangeiros.
Pesquisa do Instituto Alana indica que nove em cada dez brasileiros acreditam que as redes sociais não protegem crianças e adolescentes. O levantamento, realizado pelo Datafolha, ouviu 2.009 pessoas, com 16 anos ou mais, de todas as classes sociais, entre os dias 12 e 18 de julho.
Segundo o estudo, divulgado nesta quinta-feira (12), 97% dos entrevistados defendem que as empresas deveriam adotar medidas para proteger crianças e adolescentes na internet, através da comprovação de identidade, melhoria no atendimento ao consumidor para denúncias, proibição de publicidade e venda para crianças, fim da reprodução automática e da rolagem infinita de vídeos e limitação de tempo de uso dos serviços.