<span class="abre-texto">Entrei na sala reservada à visitação e lá estava a pequena Aurora,</span> sentada descuidadamente em suas fantasias e bugigangas – típicas de uma infância modesta, derradeiramente solitária e desgarrada dos recursos do universo tech.
Sem que me percebesse presente e a observá-la brincando, ali permaneceu entretida com uma espécie de baú aparentemente trancado a chave.
Seus dedos miúdos compunham duas mãozinhas pacientes, a manobrarem o objeto em busca de alguma possibilidade de destravamento. Não sei se naquele processo distraído e ao mesmo tempo concentrado contava ela com a sorte, a persistência ou apenas buscava desenvolver a melhor estratégia. De certo mesmo, é que nada no entorno fazia frente a seu foco e desejo.
Em comum, o metafórico silêncio a nos fazer companhia.
Esparramados ao chão, colchonetes aliviavam a dureza do piso frio e emprestavam ao ambiente um ar de neutralidade ante o que poderia inspirar mais aconchego e afetuosidade.
Eu estava ciente, contudo, de que essa sensação doía mais em mim do que na pequenina...
Ainda não tendo alcançado o circuito da subjetividade (atuante na tela mental adulta), sobreviventes infantis do abandono alegram-se com o mínimo de atenção e carinho oferecido por quem, sem se dar conta da espera e da esperança naquela visitação depositada, entra e sai dos abrigos. É perceptível que sofrem com a falta; contudo, a distração e o mecanismo defensivo da fantasia e mesmo da amnésia infantil operam para manter nesses pequenos os sonhos e a própria sanidade.
Aurora se encontra no abrigo desde os cinco meses, quando seus cuidadores perderam a guarda por violência doméstica e drogadição. Em quatro anos, não foram encontrados outros parentais para que pudesse ser acolhida no gueto familiar.
E entristece saber que, afora as questões burocráticas que atrasam muito o processo no Brasil, a dificuldade em encontrar um lar e família esbarra na idealização psíquica de quem se propõe adotar – dentre outras, expectativas sobre a faixa etária (bebês são mais desejados) e características físicas (menos apelo por portadores de necessidades especiais) – sem entrar no mérito da ciranda de preconceitos que circundam nossa sociedade e da seletividade por crianças sem irmãos.
No caso específico da menina Aurora, sua permanência no abrigo em muito se dá em virtude da não aceitação, por parte de quem a avista na visitação, de suas lesões cutâneas, especialmente a mancha bastante expressiva desenhada pelo vitiligo em seu rosto.
Considerada uma doença autoimune desenvolvida pelo sistema de defesa da própria pessoa e contra ela mesma, o vitiligo pode ser extremamente desfigurativo, causando imensos danos à autoestima e suscitando severas dificuldades quanto à socialização e construção identitária.
Em sua progressiva e esbranquiçada lesão facial, Aurora emite simbolicamente respostas nas lesões sem palavras. Ela expõe em si mesma um gozo específico, um dizer sobre o que sequer possa ser dito: frases e gritos silenciosos que romperam um dique interno para não mais silenciarem.
Conjecturo que em seu brincar, firmado no intento em destravar o pequeno objeto trancado em si mesmo, a pequena menina alcança um tédio capaz de criar caminhos possíveis à sua analfabeta dor.
E, assim, ela se faz luz nesse chão solitário; e irradia, num alvorecer grafado nas linhas da própria pele, a aurora que poucos são capazes de ver.
Para não desencantar do sujeito em humanidade, são esses poucos – que ela também espera que existam – que me suscitam esperança na adoção.
O festival de música Rock in Rio inicia nesta sexta-feira (13) e segue até domingo (22) na Cidade do Rock, localizada na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro.
O evento completa 40 anos da sua primeira edição e promete uma celebração histórica. A organização espera receber mais de 700 mil pessoas, entre moradores do estado, turistas brasileiros e estrangeiros.
Pesquisa do Instituto Alana indica que nove em cada dez brasileiros acreditam que as redes sociais não protegem crianças e adolescentes. O levantamento, realizado pelo Datafolha, ouviu 2.009 pessoas, com 16 anos ou mais, de todas as classes sociais, entre os dias 12 e 18 de julho.
Segundo o estudo, divulgado nesta quinta-feira (12), 97% dos entrevistados defendem que as empresas deveriam adotar medidas para proteger crianças e adolescentes na internet, através da comprovação de identidade, melhoria no atendimento ao consumidor para denúncias, proibição de publicidade e venda para crianças, fim da reprodução automática e da rolagem infinita de vídeos e limitação de tempo de uso dos serviços.
<span class="abre-texto">Entrei na sala reservada à visitação e lá estava a pequena Aurora,</span> sentada descuidadamente em suas fantasias e bugigangas – típicas de uma infância modesta, derradeiramente solitária e desgarrada dos recursos do universo tech.
Sem que me percebesse presente e a observá-la brincando, ali permaneceu entretida com uma espécie de baú aparentemente trancado a chave.
Seus dedos miúdos compunham duas mãozinhas pacientes, a manobrarem o objeto em busca de alguma possibilidade de destravamento. Não sei se naquele processo distraído e ao mesmo tempo concentrado contava ela com a sorte, a persistência ou apenas buscava desenvolver a melhor estratégia. De certo mesmo, é que nada no entorno fazia frente a seu foco e desejo.
Em comum, o metafórico silêncio a nos fazer companhia.
Esparramados ao chão, colchonetes aliviavam a dureza do piso frio e emprestavam ao ambiente um ar de neutralidade ante o que poderia inspirar mais aconchego e afetuosidade.
Eu estava ciente, contudo, de que essa sensação doía mais em mim do que na pequenina...
Ainda não tendo alcançado o circuito da subjetividade (atuante na tela mental adulta), sobreviventes infantis do abandono alegram-se com o mínimo de atenção e carinho oferecido por quem, sem se dar conta da espera e da esperança naquela visitação depositada, entra e sai dos abrigos. É perceptível que sofrem com a falta; contudo, a distração e o mecanismo defensivo da fantasia e mesmo da amnésia infantil operam para manter nesses pequenos os sonhos e a própria sanidade.
Aurora se encontra no abrigo desde os cinco meses, quando seus cuidadores perderam a guarda por violência doméstica e drogadição. Em quatro anos, não foram encontrados outros parentais para que pudesse ser acolhida no gueto familiar.
E entristece saber que, afora as questões burocráticas que atrasam muito o processo no Brasil, a dificuldade em encontrar um lar e família esbarra na idealização psíquica de quem se propõe adotar – dentre outras, expectativas sobre a faixa etária (bebês são mais desejados) e características físicas (menos apelo por portadores de necessidades especiais) – sem entrar no mérito da ciranda de preconceitos que circundam nossa sociedade e da seletividade por crianças sem irmãos.
No caso específico da menina Aurora, sua permanência no abrigo em muito se dá em virtude da não aceitação, por parte de quem a avista na visitação, de suas lesões cutâneas, especialmente a mancha bastante expressiva desenhada pelo vitiligo em seu rosto.
Considerada uma doença autoimune desenvolvida pelo sistema de defesa da própria pessoa e contra ela mesma, o vitiligo pode ser extremamente desfigurativo, causando imensos danos à autoestima e suscitando severas dificuldades quanto à socialização e construção identitária.
Em sua progressiva e esbranquiçada lesão facial, Aurora emite simbolicamente respostas nas lesões sem palavras. Ela expõe em si mesma um gozo específico, um dizer sobre o que sequer possa ser dito: frases e gritos silenciosos que romperam um dique interno para não mais silenciarem.
Conjecturo que em seu brincar, firmado no intento em destravar o pequeno objeto trancado em si mesmo, a pequena menina alcança um tédio capaz de criar caminhos possíveis à sua analfabeta dor.
E, assim, ela se faz luz nesse chão solitário; e irradia, num alvorecer grafado nas linhas da própria pele, a aurora que poucos são capazes de ver.
Para não desencantar do sujeito em humanidade, são esses poucos – que ela também espera que existam – que me suscitam esperança na adoção.
O festival de música Rock in Rio inicia nesta sexta-feira (13) e segue até domingo (22) na Cidade do Rock, localizada na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio de Janeiro.
O evento completa 40 anos da sua primeira edição e promete uma celebração histórica. A organização espera receber mais de 700 mil pessoas, entre moradores do estado, turistas brasileiros e estrangeiros.
Pesquisa do Instituto Alana indica que nove em cada dez brasileiros acreditam que as redes sociais não protegem crianças e adolescentes. O levantamento, realizado pelo Datafolha, ouviu 2.009 pessoas, com 16 anos ou mais, de todas as classes sociais, entre os dias 12 e 18 de julho.
Segundo o estudo, divulgado nesta quinta-feira (12), 97% dos entrevistados defendem que as empresas deveriam adotar medidas para proteger crianças e adolescentes na internet, através da comprovação de identidade, melhoria no atendimento ao consumidor para denúncias, proibição de publicidade e venda para crianças, fim da reprodução automática e da rolagem infinita de vídeos e limitação de tempo de uso dos serviços.